Com “Records” e recordações, os 55 anos de Discolândia em Joinville
Conheça o ícone cultural que lutou na guerra dos formatos de mídias musicais
Por Brendha Souza (Shoyu)
Em Joinville existe um conjunto de profissionais que resiste ao estereótipo cinza industrial reproduzido socialmente pela massa de cidadãos do município, e busca solidificar as veias artísticas, independentes e criativas. Localizada na rua XV de Novembro desde 1969, há um enorme exemplo de resiliência: a Discolândia, uma loja de discos de vinil, fitas cassete, CDs e players de música que segue desenvolvendo laços com diversas gerações e testemunhando as evoluções do mercado.
Para os bons colecionadores, o lugar é um verdadeiro paraíso e um tesouro joinvilense. Na Discolândia, é possível encontrar desde o CD mais vendido de 2024, The Tortured Poets Department, de Taylor Swift, até grandes clássicos da música, como LPs de Michael Jackson. A loja tem o poder de transcender barreiras e se conectar com fãs de todos os gêneros musicais. Marli Avancini, que, junto ao esposo Alexandre Wojtech, é proprietária do estabelecimento, compartilha sua história e relata as dificuldades que foram superadas ao longo dessa jornada.
A guerra dos formatos de mídias musicais
A competição entre diferentes padrões de distribuição de arquivos musicais e suas tecnologias teve seu início nos anos 2000 e se alastra até a atualidade com o triunfo das plataformas de streaming (como Spotify, Deezer, Youtube Music e etc.). Marli aponta que mesmo com a quantidade acima de qualidade virando o destino das produções musicais, as pessoas encontraram uma oportunidade de, ao viver o passado, consumirem uma musicalidade rica: longe das novas produções de cantores virais de canções chicletes de uma estrofe. Seguindo este gancho, ao ser questionada sobre as atuais atribuições que fizeram o disco de vinil retornar a ser a mídia mais popular da indústria musical, após tantas outras readaptações, Avancini celebra sem saudosismo “Sempre tivemos esperança nesta nova juventude! (…) pois as redes sociais facilitaram para que quem não tivesse muita competência para música caísse no sucesso, (…) e as rádios reproduzem o que está em alta, o que todos querem ouvir”. Mas conclui que em meio a este cenário há atualmente uma onda muito seletiva de ouvintes, e que é por eles que a loja segue de portas abertas.
Patrimônio & pilar cultural
Não há forma de contar sobre a história da Discolândia sem iniciar pelas suas raízes em 1951. O avô de Alexandre, seu Waldemar, deixou a Alemanha e se estabeleceu em Joinville, fundando a fábrica Elwo Eletrônica Catarinense, especializada na construção de rádios e radiolas, que funcionou até meados dos anos 70. Após se encontrar neste setor comercial, senhor Wojtech abre seu próprio negócio sem imaginar que em 15 de janeiro de 2025 comemoraria os 56 anos de empreendimento ao lado da companheira. Em tom descontraído Marli fala sobre os sentimentos do casal e reconhece os apoiadores locais: “Não nos sentimentos com 56 anos, quem trabalha com música não envelhece, nós acompanhamos todos os movimentos! (…) Enquanto vocês estiverem no jornalismo nos dando oportunidade de falarmos com vocês, então a história nunca acabará, (…) quem leva essa cultura não somos nós ”.
Vida longa a Discolândia
Driblando todos os contratempos apresentados acima, um novo monstro se instaura: A cultura do consumo instantâneo com o desenvolvimento da internet. Em determinado momento na entrevista, ao entrar nos méritos do streaming no universo da digitalização da música, Marli opina: “O celular deu essa quebra no mundo! Não foi só na música, foi no livro, na rádio, na TV… todos buscam um método rápido de fazer as coisas, e este método nem sempre é o melhor. (…) Se você falar de Júpiter Maçã ninguém sabe quem é, eu sei! Se falar de Violetas de Outono e tantos outros que fizeram parte [da história musical] ninguém sabe. Tem catarinenses que não fazem ideia de quem são o grupo Engenho. Estas coisas se perderam”. Marli sorriu ao ser questionada polemicamente sobre a sua opinião pessoal acerca da pirataria e, mesmo tendo sofrido todos os impactos causados por tal, afirmou que há coisas muito maiores que os vendedores informais, pois os mesmos “não tinham noção da proporção de seus crimes”.
Em meio a decepções com o mercado e as alegrias intraduzíveis que a loja provou na vida do casal ao longo dos anos, a vendedora diz com orgulho que “Os clientes que restaram são pessoas muito cultas”, e com imensa paixão seguem preservando, no centro do município, um acervo rico e fascinante que transforma a loja em um ponto de encontro para almas sensíveis.