Pandemia castiga artistas de teatro
Um ano longe dos palcos. Um ano sem ouvir o som dos aplausos. A pandemia obrigou os artistas de teatro a buscarem outras alternativas de trabalho. Para a Ajote (Associação Joinvilense de Teatro) a receita caiu pela metade e houve interrupção de cobrança da anuidade dos associados. Antes do Covid, o galpão da associação mantinham uma programação contínua, com atrações pelo menos nos finais de semana.
No ano 2000, o Fórum Permanente de Teatro serviu como espaço de reflexão e canal representativo do movimento teatral junto ao poder público e as demais instâncias da sociedade. Após um ano de funcionamento do fórum, nasceu a Ajote (Associação Joinvilense de Teatro), em dezembro de 2001. Atualmente, a Ajote conta com 13 grupos associados mais um artista independente.
Os recursos da lei Adir Blanc trouxeram um pouco de alento à classe artística. “Não vem sendo fácil. Foi um amparo (essa lei) para alguns grupos que conseguiram se inscrever, porém a gente acredita ainda que há uma necessidade de articulação do poder público e a sociedade civil para que haja uma força-tarefa para utilização desses recursos”, explica o ator e diretor Cássio Correia.
Os atores Angela Finardi e Jonas Raitz destacam a importância da arte para a sociedade. Para a atriz, o teatro significa um encontro entre público e plateia. “Permite que a gente reflita sobre a sociedade em que vivemos e vivenciar essa experiência no tempo presente”, define. O ator considera que os espetáculos são uma oportunidade de transformar o mundo para melhor. “A arte, para mim, é a minha vida, foi no teatro que construí toda a minha base profissional, pessoal e social”, enaltece.
Os artistas joinvilenses lamentam a paralisação das peças teatrais, contudo entendem a necessidade dessa pausa. “O sentimento que carregamos por não podermos nos apresentar presencialmente é de um vazio. Porém é um momento necessário de cuidado e retirada”, avalia Angela. A atriz lembra das discussões com o grupo dela, onde refletiram que existiram outras pandemias e o teatro sobreviveu. “Vivemos um momento de resiliência e cuidado”, conclui. Jonas confessa que a situação causa certo desânimo. “Parece que arrancaram o nosso coração, de um dia para o outro tiraram o nosso chão, literalmente, o nosso habitat, apesar de eu acreditar que o teatro é feito todos os dias, em todo momento”, conta o ator.
Impacto econômico
Segundo dados divulgados pelo jornal O Globo, o mercado teatral movimenta aproximadamente 1 bilhão de reais por ano no Brasil. Os artistas de Joinville divergem sobre a valorização do teatro na cidade. Para Ângela, as peças teatrais sempre estiveram em alta, desde que ela atuou pela primeira vez há 25 anos. “Não posso reclamar de desvalorização do teatro, porque já aconteceu comigo e a minha colega Sabrina Lermen, de apresentarmos uma peça, o SOS mulher, onde tivemos mais de 1000 pessoas na fila do lado de fora do Juarez Machado, nos três dias em que ficamos em cartaz”, reflete. Na época, ela ficou impressionada com a repercussão e o prêmio nacional que conquistaram, porque não eram atrizes globais. Na opinião da atriz, se tem uma peça de qualidade em um lugar o público irá ao teatro.
Para Raitz, o teatro é considerado supérfluo por parte da sociedade e Joinville precisa de mais investimento em cultura. “A valorização poderia ser maior, porque somos uma cidade muito rica. Poderíamos ter políticas públicas que fomentassem a arte como um todo”, opina.
O ator lamenta que os artistas não consigam viver da própria arte no Brasil, precisando acumular funções.
Adaptações durante a pandemia
Angela, Cassio e Raitz, assim como os artistas de um modo geral, precisaram reinventar suas vidas profissionais durante a pandemia. A atriz relembra que, o formato do Verão Teatral, programação da Ajote, ganhou transmissão on-line. Além disso, houve uma conversa virtual em tempo real com a plateia. “Fizemos também uma experiência com 5 atrizes de regiões diferentes de Santa Catarina. Cada uma recebeu um monólogo para trabalhar e foi agendado um dia para que fizéssemos uma live em um estúdio com qualidade técnica, microfone e tudo”, recorda.
Angela considera essa experiência interessante, porque precisou improvisar, algo que está habituada a fazer. “Nesse dia não podíamos regravar nada, diferente do cinema ou um vídeo. É uma experiência em tempo real. Essa sensação de estar presente, do espetáculo não poder parar assemelha-se com a do teatro”, destaca a atriz.
Raitz desenvolve um trabalho sobre comunicação criativa, estuda a capacidade que o ser humano tem de enfrentar as dificuldades de comunicação. “Faço periodicamente lives com artistas e mostro para as pessoas o quão fundamental é a arte na vida delas”, explica. Ele cria espetáculos, enquanto conversa com o elenco teatral dele virtualmente. “A forma que estou passando pela pandemia é produzindo esse conteúdo, material digital”, revela.
Com a proibição de aglomerações, a Ajote passou a apostar nas exibições on-line durante o Verão Teatral, com cobrança de ingressos, ou melhor, de acesso aos links. “A gente tinha uma expectativa do verão teatral poder ser realizado este ano com um público limitado, mas por causa do avanço da pandemia, decidimos não organizar”, comenta. A associação está atenta aos próximos decretos do governo para tentar organizar a programação teatral de 2021.