Instagram aumenta o número de brechós online
Por Jéssica Horr, publicado originalmente no jornal Primeira Pauta
A pesquisa pela hashtag “brechó” tem quase dois milhões de resultados no Instagram. A onda de reaproveitamento de peças de vestuário tomou conta da rede social nos últimos dois anos. Por vezes também chamados de “desapegos” ou “garimpos”, o formato de vender roupas pela plataforma online traz inovação e praticidade para os consumidores. Os motivos para começar um perfil de brechó no Instagram podem variar. Geralmente envolvem a necessidade de dar outro destino para roupas antigas.
No caso de Sueila Carlesso, 19 anos, a motivação foi diferente. O BadGal Brechó nasceu em outubro de 2018 de uma necessidade de renda extra. A filha, na época com nove meses, precisava de uma creche, mas não havia vagas. Sem conseguir encontrar emprego e sem renda, a alternativa foi desapegar de roupas que não serviam mais. “Desde muito nova comprei em brechó e bazar beneficente”, conta. “Hoje, 100% do meu armário são peças que eu garimpei, então eu sempre tive muita roupa”.
Em outras situações, o sucesso vem quase que por acaso. Keidima Inhaia, 29, não tinha a intenção de abrir uma loja com desapegos quando começou a vender peças que não queria mais, em um grupo de Whatsapp, em São Francisco do Sul. As clientes pediam roupas novas quando ela fazia as entregas. “Eu conheci uma mulher que veio morar aqui e tinha um brechó só no Instagram, aí a gente resolveu se juntar e abrir uma loja física e online também”, comenta. Assim foi criado, há um ano, o Sunset Brechó, com a mistura do estilo moderno de Keidima e o vintage de Luan, a sócia.
Não tão numerosa quanto a hashtag de brechós, mas ainda assim considerável, a palavra “garimpo” tem 451 mil resultados no Instagram. É o termo usado pelos donos de brechós, quando se referem ao ato de procurar boas peças para vender. As “garimpeiras” frequentam bazares de outras lojas ou bazares beneficentes. O trabalho é árduo, mas vale a pena. “Tem mesas enormes com roupas empilhadas, nas quais não existe organização, tem muita roupa e por um preço bem barato”, explica Sueila.
Procurar peças antigas e dar um novo significado a elas é, além de um processo, parte de uma paixão. Maria Gabriela da Costa, 29, e a mãe, Valdiria de Oliveira, 69, cuidam de um brechó juntas. Para manter a loja sempre cheia de novidades, fazem o que apelidaram de “garimpo bruto”. Da mesma forma que é feito com diamantes, mas com montanhas de roupa. Cerca de 90% do resultado das vitrines e araras vêm de ações sociais. Depois da busca vem a curadoria, que envolve limpeza, retoques e etiquetamento. “Eu amo esse tipo de garimpo, porque além de estarmos ajudando causas sociais, achamos peças raras”, diz Maria Gabriela.
As “garimpeiras” podem conseguir novas roupas em vários lugares , como desapegos de outras pessoas. Fazer consignado também é uma prática comum: a pessoa entrega a peça para o brechó e, se vendida, fica com uma porcentagem do valor.
Um dos maiores estereótipos do brechó, e talvez a maior de suas premissas, é o preço baixo. Mas o conceito de “barateza” pode ser relativo. É comum que as garimpeiras busquem novidades fora dos bazares locais: peças importadas ou únicas também têm espaço nas vitrines e o valor agregado pode assustar de início. Keidima conta que a peça mais cara que vendeu foi um poncho por R$ 200. O contraste com o valor original é grande; a peça, na internet, custava R$ 1.500. Segundo ela, a procura foi enorme.
Assim como em qualquer tipo de negócio, a divulgação e o atendimento dos brechós é muito importante. A peculiaridade de vender pelo Instagram é que o atendimento precisa ser muito mais qualificado, já que o cliente só tem a foto da peça como referência. E a criatividade rola solta, como no caso do BadGal. Sueila faz autorretratos e combina roupas que estão disponíveis. Para ela, isso ajuda a criar a identidade do brechó, permite que quem olhe o feed imagine várias possibilidades com uma mesma peça.
Quando não existe uma loja física, a logística da venda funciona de uma forma um pouco diferente: as entregas são feitas nos terminais de ônibus de Joinville, mediante uma taxa para pagar o transporte.
Impacto ambiental da indústria da moda
Segundo pesquisa da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), em 2018 a produção média têxtil no Brasil foi de 1,3 milhão de toneladas. O número é menor que o de 2016, por exemplo (1,6 milhão de toneladas), mas ainda é preocupante. Foram quase 9 bilhões de peças produzidas em contraste com os 208 milhões de habitantes brasileiros (de acordo com dados de 2018 do IBGE).
Outros estudos apontam a indústria da moda como uma das mais poluentes no mundo. Nem todos os materiais demoram tanto para se decompor na natureza. O algodão leva de um a cinco meses. Já o poliéster, por sua vez, dura até 400 anos na natureza antes de se desintegrar por completo. Além do tempo de decomposição, o uso de água também é alarmante. Segundo dados do Science Media Center, para produzir um par de sapatos são gastos em torno de 3,8 mil litros de água.
Nesse âmbito, os brechós são uma boa forma de praticar a chamada “moda sustentável”. Optar por uma peça usada ao invés de comprar uma nova e iniciar um novo ciclo de decomposição, além de ajudar pequenos empreendedores como Sueila, Keidima e Maria Gabriela, também colabora com o meio ambiente. É usar a moda de forma ética, mais do que simplesmente uma peça de vestuário.
Quem tem brechó geralmente bate na tecla da sustentabilidade. Para Sueila, a junção de bom preço com a ajudar ao planeta, além de ser extremamente benéfica para os dois lados, também gera discussões relevantes, principalmente em uma época em que a moda se tornou descartável.