Série “Feel Good” diverte com história brutalmente honesta
Dos altos e baixos de relacionamentos a vícios e sexualidade, série toca em assuntos densos sem perder a leveza de uma boa comédia
Por Pedro Novais
“Eu entrei na sua vida como um tornado cheio de gravetos e coco.” A frase dita por Mae em meio a uma DR expressa bem os desafios de qualquer relacionamento quanto às bagagens que cada pessoa carrega. Bagagens, muitas vezes, mais pesadas quando se trata de um relacionamento LGBTQIA+. Baseada em experiências vividas por sua criadora e protagonista, a atriz e comediante Mae Martin, “Feel Good” escancara essas bagagens sem perder o bom-humor. Ao longo de duas temporadas, a série consegue ser encantadora e, ao mesmo tempo, poderosa.
Criada por Martin e Joe Hampton, a produção estreou em março de 2020, pelo Channel 4, e foi distribuída internacionalmente pela Netflix. A série ganhou uma segunda e última temporada, lançada no início de junho deste ano, pela gigante dos streamings.
“Feel Good” acompanha os altos e baixos da relação de Mae (uma espécie de autorretrato da atriz) e sua namorada, George (Charlotte Ritchie), em uma Londres contemporânea e nada glamourizada. Mae é uma comediante canadense – ex-viciada em drogas – e George, uma reprimida inglesa de classe média em busca do momento ideal para sair do armário.
Apesar da premissa simples, o relacionamento das protagonistas logo abre espaço para complexas reflexões sobre identidade, sexualidade e saúde mental. Com um humor depreciativo semelhante à popular (e ótima) Fleabag, a série toca em assuntos pesados sem perder a leveza de uma boa comédia.
Enquanto a primeira temporada mostra o casal em uma problemática relação de dependência emocional – algo semelhante ao que a série Euphoria abordou com “Rules” – e apresenta Mae cada vez mais perto de uma possível recaída, a segunda parte foca no autoconhecimento e na dor que é recomeçar. Com um roteiro consistente, a série tem uma jornada sólida e fecha com um final otimista.
O ponto alto da série está na sagacidade do roteiro. Os personagens são reais e cheios de nuances, assim como as relações estabelecidas entre eles. A série discute diversidade sexual, papel de gênero, autodescobrimento, relacionamento familiar, vícios, saúde mental e até abuso. Todos bem trabalhados e devidamente desenvolvidos, em um texto afiado e instigante, que conquista e conduz o telespectador, entregando somente o necessário.
O elenco é um show à parte. A química entre as carismáticas Mae Martin e Charlotte Ritchie faz você torcer por elas. Martin transmite muito bem a vulnerabilidade existente sob o bom humor de sua personagem. Já Ritchie faz uma personagem retraída, porém com um desenvolvimento incrível e cheio de facetas ao longo dos episódios. O elenco de apoio não fica atrás, com destaque para a atuação de Lisa Kudrow (a Phoebe de “Friends”), que interpreta a excêntrica e engraçada Linda, mãe de Mae.
A série se distribui em duas temporadas de seis episódios, com média de 25 minutos cada. Com ritmo dinâmico, “Feel Good” é perfeita para maratonar em um final de semana. Tempo ideal para se divertir e refletir com esta produção da Netflix.