Home Office é fingir que está trabalhando? Gestores enfrentam desafios no modelo remoto
Por: Guilherme Martins Rosa
O trabalho remoto surgiu como uma solução emergencial por causa da pandemia de Covid-19, mas acabou se tornando o modelo padrão de trabalho em muitas empresas. No Brasil, as vagas para home office cresceram 496% em 2022. Além disso, 92% dos profissionais preferem realmente trabalhar de casa, com eventuais idas ao escritório presencial.
No entanto, este novo modelo exige mudanças na forma de trabalhar, e é aí que surgem os problemas. Algumas lideranças relatam dificuldades e até golpes na gestão de equipes remotas.
Elon Musk, diretor da multinacional Tesla, viralizou este ano ao afirmar que trabalhar remotamente é o mesmo que fingir que está trabalhando. Será mesmo?
Home Office abre brecha para golpes
“Já passei por muitas situações de pessoas fingirem que estavam trabalhando, e darem golpes dos mais diversos níveis”, relata Nayara Luchetti, Gerente de Marketing em uma empresa de tecnologia com sede em Joinville (SC), mas que adota o trabalho 100% remoto desde o início da pandemia.
Certa vez, uma profissional contratada por Nayara demorou para se adaptar ao trabalho, apresentando baixa performance no início, o que não é incomum. A colaboradora chegou a afirmar que estava com Burnout.
Até que um dia, por acaso, Nayara descobriu que a nova contratada estava trabalhando em dois empregos ao mesmo tempo, sem o conhecimento de nenhuma das duas empresas:
“Eu encontrei a outra chefe dela numa loja e descobri que ela nunca tinha pedido demissão [do emprego anterior]. Ela estava tentando levar os 2 trabalhos ao mesmo tempo, por isso não estava dando conta.”, relata Nayara.
“Depois desse caso, eu já vivi outros 6 ou 7 parecidos, de pessoas que demoram dois ou três meses na fase de onboarding (integração), para depois eu descobrir que a pessoa estava em outro emprego, estava mentindo, ou não era quem se apresentou. Eu nunca vi nada parecido [no presencial]”, afirma Nayara, que faz gestão de equipes desde 2017.
Ela ressalta que a mensuração do trabalho no home office se dá por meio das entregas. O problema é que, caso alguém estiver passando a perna na empresa, demora um tempo até ficar comprovado que não é apenas um problema de performance temporário. “A pessoa consegue enrolar de uma forma que no presencial ela não conseguia.”, explica.
Situações bizarras envolvendo o home office não são difíceis de encontrar. Há até um relato no blog Ask a Manager, da escritora e consultora em gestão de pessoas Alison Green, sobre um profissional que foi aprovado na entrevista remota, mas a pessoa que apareceu para trabalhar foi outra, se passando pelo entrevistado. Nos EUA isso tem até nome: Imposter Interviewers.
Gestão presencial e gestão remota: diferenças
Para lideranças que estavam acostumadas a ver com os próprios olhos quem chegava cedo e saía tarde do escritório, o modelo remoto impõe uma mudança radical na forma de gerenciar equipes. Agora, é preciso encontrar formas de coordenar o trabalho sem necessariamente ver ele sendo feito.
“Na gestão presencial, você consegue se comunicar muito melhor, fazendo uma leitura da linguagem corporal da pessoa, ver se ela está bem, se está mal. É muito mais fácil ver quem está trabalhando em que, dar uma olhadinha. Não tem como uma pessoa trabalhar três meses e só depois você descobrir que ela não estava trabalhando”, afirma a Gerente de Marketing.
Para ela, a principal mudança de mindset na transição para o trabalho remoto foi perceber que não adianta tentar controlar, durante 24 horas por dia, se os profissionais estão trabalhando ou não. As pessoas precisam se encaixar em uma rotina específica e em cerimônias para realizar o trabalho remotamente.
“Na pandemia, a gente ficou muito permissivo. Até um ano depois, quando a gente entendeu que precisaria de uma rotina saudável de gestão home office”, comenta. A partir disso, a gestão se sustentou por meio de rotinas definidas especialmente para o trabalho remoto.
Angelina Diniz, que gerencia uma equipe de comunicação 100% online em uma empresa de tecnologia de Joinville, diz que o segredo está na confiança:
“Ter pessoas na equipe em quem eu possa confiar e construir um vínculo com elas, que elas possam ter abertura para conversar comigo e falar que o volume de trabalho está muito alto ou baixo. Acho que é a forma mais humana de lidar com essa distância e evitar o micro gerenciamento, que não é positivo para nenhum dos lados.”, opina.
A era do home office
Angelina começou a fazer gestão de pessoas já no modelo remoto. Ela nunca passou por nenhum golpe durante esse tempo, mas pensa que isso está relacionado ao fit cultural com a empresa: “Realmente [o home office] não é para todo mundo. As empresas que adotam esse modelo de trabalho têm que levar isso em consideração no processo seletivo”, ressalta.
Ela ressalta que o modelo trouxe benefícios à qualidade de vida dos profissionais. De fato, uma pesquisa realizada pela Sodexo e a consultoria Harris Interactive revela que os profissionais sentem-se beneficiados por não precisarem utilizar transporte público e ficarem mais próximos da família.
Assim, a possibilidade de fazer home office se tornou um benefício utilizado pelas empresas para atrair colaboradores das mais diversas regiões. Isso sem falar na economia em relação à manutenção de um espaço presencial. Além disso, também há estudos que sugerem aumento de produtividade entre os profissionais nessa modalidade de trabalho.
Diminuindo as distâncias
Para garantir a proximidade dos times mesmo à distância, tanto Nayara quanto Angelina concordam que a saída é incentivar momentos de descontração entre os membros do time.
“Precisa ter rituais para que as pessoas vejam os colegas, fazer happy hours pelo menos mensalmente… Na minha equipe, como todos são de Joinville, a gente sempre faz [happy hour] presencial”, conta Angelina.
E quando as equipes possuem pessoas espalhadas pelos quatro cantos do mapa? Nesse caso, nada impede um Happy Hour online. “É uma geração que está acostumada a ter conversas sérias por WhatsApp”, ressalta Nayara. A dica dela é marcar momentos de interação na agenda, e permitir aqueles 5 minutos de conversa boba na reunião diária. Afinal, nada une tão bem os colaboradores de uma empresa quanto uma boa conversa com um cafezinho!