Faculdade Ielusc ganha coletânea do primeiro jornal brasileiro
Por Destiny Goulart e Tiago Feitosa Rodrigues
O Correio Braziliense ou Armazém Literário foi o primeiro jornal brasileiro a circular no país. Era produzido em Londres, por Hipólito José da Costa, entre os anos de 1808 a 1822. As 175 edições vieram para o Brasil de navio e cada uma demorava entre 45 a 90 dias para chegar. A circulação era clandestina, pois uma ordem da Coroa proibia a entrada e publicação do periódico. Agora, a Faculdade Ielusc conta com uma Coletânea Fac-Similar do Correio Braziliense, doada por Carlos Taufik Haddad ao curso de Jornalismo. São 32 livros que totalizam 22.862 páginas.
Segundo Carlos Haddad, após uma visita às instalações da Faculdade Ielusc, a convite do amigo Silvio Melatti, surgiu a ideia de doar a coleção. Dos 32 volumes, 29 são de cópias dos jornais. O livro 30 contém textos complementares, ilustrações, bibliografia, índice remissivo dos artigos introdutórios do volume 1. O volume 31 contém o índice remissivo e temático dos 29 volumes originais (reprodução fac-similar da edição de 1976 da Biblioteca Nacional – Rio de Janeiro). “Os demais volumes foram copiados da coleção do bibliófilo José Mindlin, inclusive capas e sobrecapas”, comentou Haddad.
Coordenador Editorial da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, onde trabalhou durante 38 anos, Carlos foi coeditor da coletânea. O idealizador e editor foi o jornalista Alberto Dines. A edição contou com a parceria do Observatório da Imprensa e do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo – Labjor, da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, Jornal Correio Braziliense e Fundação Assis Chateaubriand. “Para a consecução da obra, as equipes das três instituições participaram desde o projeto até a sua distribuição em pouco mais de dois anos de trabalho. Foram impressos 3.000 exemplares, distribuídos por conta de um planejamento da equipe de logística da Imprensa Oficial, divididos em vários segmentos: envio para livrarias dos exemplares avulsos para venda até o encerramento da produção, distribuição para os assinantes e entrega solene para as 600 bibliotecas públicas. Os custos da obra foram divididos entre os partícipes”, conta o doador.
Como era Coordenador Editorial, Carlos acabou recebendo todos os exemplares da edição para analisar os aspectos técnicos do produto pronto. “O fascínio que cada editor sente ao acompanhar até o seu fim uma edição é indescritível, além da natural curiosidade intrínseca do editor. Assim, recebi todos os exemplares que fui armazenando na minha biblioteca”, conta.
Missão de jornalista
Após o recebimento dos livros, Carlos leu todos. Ele destaca que Hipólito da Costa é considerado pioneiro do pensamento econômico brasileiro por conta da influência dos seus escritos sobre a abertura comercial de 1808, sobre o Tratado de 1810, além de questões como política liberal ou protecionista inerentes aos problemas da escravidão e colonização. “Coerente com a sua formação, sempre foi consistente e conscientemente contrário ao Estado Absolutista e à censura à imprensa”, observa.
Entre as passagens que mais lhe chamam a atenção no Correio Braziliense, ele cita uma no volume XIV, de março de 1815, página 273, que demonstra a pluralidade de ângulos abordados pelo jornal. “Nesse trecho há solicitação de medidas convenientes para melhorar a vida de cidadãos órfãos que eram sumariamente presos em cadeias públicas, sugerindo que, daquele tempo em diante, os chamados Juízes dos Órfãos os acolhessem numa instituição, a Casa Pia”, explica.
O Correio Braziliense é considerado o maior empreendimento jornalístico individual de toda a história da imprensa brasileira. Para Carlos, as lições que Hipólito deixou ao jornalismo são muitas, pois abriu caminhos desconhecidos com uma imprensa de prosa moderna, clara, vibrante, concisa, repleta de pensamentos, despojada de elementos, acessórios e que exprimia os temas centrais da época. “O papel do jornal e do jornalista, quanto a sua missão essencial, não mudou, continua levando informações”, afirma.
Impulso para novas pesquisas
A incorporação da Coletânea do Correio Braziliense ao acervo da Faculdade Ielusc pode impulsionar importantes pesquisas tanto para acadêmicos de Comunicação como de História. Durante a Semana Integrada de Comunicação, em setembro, os volumes ficarão expostos ao público e, depois disso, segundo o Coordenador de Jornalismo, Silvio Melatti, serão incorporados ao acervo da biblioteca da faculdade. Veja mais detalhes no vídeo.
Hipólito da Costa: um espião que amava o jornalismo
A história de Hipólito da Costa começa em 1774. Nascido de uma família abastada, na Colônia de Sacramento, onde atualmente se localiza o Uruguai, mas que, na época, pertencia ao Império Português, Hipólito é o patrono do jornalismo do Brasil. Começou a editar o Correio Braziliense em 1808, no mesmo ano em que a família real portuguesa veio para o Brasil, e prosseguiu até 1822, ano da independência brasileira.
Iniciou seus estudos em Porto Alegre, concluindo-os na Universidade de Coimbra, em Portugal. Com duas graduações – Filosofia e Direito – ele familiarizou-se com ideias do Iluminismo, que o influenciaram ao longo dos anos.
Após se formar na Universidade de Coimbra, o jovem advogado começou a trabalhar para o governo português. Em 1798, aos 24 anos, Hipólito foi enviado para a América do Norte para fazer espionagem industrial acerca das tecnologias disponíveis nos Estados Unidos e no México, desde a área da agricultura até a engenharia. Em sua viagem aos Estados Unidos, o que mais o impressionou foi o apreço que as instituições públicas possuíam para com a liberdade de comércio e, especialmente, para com a liberdade de imprensa e o efeito da imprensa livre sobre a sociedade civil. Nos Estados Unidos, Hipólito filiou-se à Maçonaria, que tinha orientação liberal. Anos mais tarde, essa associação seria o principal motivo de sua prisão.
Em 1803, voltando de uma viagem à Inglaterra, onde foi tratar de assuntos da Maçonaria, Hipólito foi preso pela inquisição portuguesa. Como se recusou a revelar o nome de outros membros maçons, a Inquisição manteve o advogado cativo num pequeno quarto por dois anos e meio até o dia em que conseguiu escapar e pediu exílio na Inglaterra.
O Correio Braziliense foi marcado pela visão antiabsolutista de Hipólito da Costa. Não que ele chegasse ao ponto de defender a extinção da monarquia, mas desejava restrições políticas à autoridade do Estado, semelhantes às que vira nos Estados Unidos e na Inglaterra. Também defendia o abolicionismo e o fim do sistema de Capitanias Hereditárias e a instauração do sistema de Províncias. Ele não concordava com o nível de autoridade concedido aos comandantes e foi defensor da independência do Brasil.