Debate sobre imigrantes e refugiados mobiliza igrejas cristãs
Por Diego Mahs
Por ser um dos destinos mais procurados no Sul do país pelos imigrantes em busca de emprego, Joinville foi escolhida pelo Conic (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil) para sediar o evento “Imigrantes e Refugiados – Desafios da Casa Comum”. Durante dois dias, (22 e 23 de março), no auditório da Universidade Católica, cerca de 60 pessoas discutiram a situação das pessoas que deixam seu país natal em busca de sobrevivência no Brasil.
Na noite de abertura, a jornalista Lizandra Carpes apresentou os propósitos do evento e a assistente social do Exército da Salvação, Damares Martins, leu um texto sobre os direitos negados aos imigrantes e o sofrimento que enfrentam.
O representante da Igreja Episcopal Anglicana, Nilo Junior, leu a passagem bíblica do bom samaritano e falou sobre a necessidade de empatia. “Jesus nos ensinou, através da Samaria, que o amor de Deus não tem pátria”, destacou.
A mesa de debate contou com a teóloga Valéria Vilhena e o pastor Henrique Vieira. Valéria é mestre em Ciências da Religião e doutora em Educação e História Cultural; Vieira é professor, cientista social, historiador, teólogo, pastor e ator. A mediação da mesa foi feita pela secretária do Conic, pastora Romi Benke.
Valéria comentou sobre sua participação no movimento feminino EIG – Evangélicas pela Igualdade de Gênero e enfatizou a falta de representatividade da bancada evangélica do congresso. “O movimento pentecostal tem como base mulheres pobres e negras, nosso feminismo vai dialogar com essas mulheres”, pontuou. A teóloga também criticou o fundamentalismo atual, pois vê, em muitas igrejas, a criação de um inimigo e o uso da imagem de Deus como se fosse um general.
Pastor alerta para riscos do fundamentalismo
Um trio de imigrantes haitianos apresentou uma canção antes da fala do pastor da Igreja Batista do Caminho, Henrique Vieira. Assim como a teóloga Valéria, Vieira também chamou a atenção para o problema do fundamentalismo religioso. “Existe, no fundamentalismo, uma convicção de verdade histórica que exclui a realidade humana, da autocrítica e da dúvida”, afirmou. Para Vieira, o maior exemplo disso é o movimento “Bíblia sim, Constituição não”, cujo líder tem aversão pelas discussões do mundo moderno, tais como a imigração, debate de gênero, entre outros.
O pastor disse que, em Barra Mansa, município do Rio de Janeiro, um decreto municipal obrigou a oração do Pai Nosso em escolas. “Considero isso, do ponto de vista laico, um absurdo, porque essa oração não é universal, nem todas as religiões são cristãs”, afirmou. Para Henrique, apesar de o decreto ter caído, isso é um indicativo do início de uma doutrinação fundamentalista. Ele também destacou que o fundamentalismo não aceita o debate e por isso não quer discutir o que é cultural ou não. “Esse discurso esvazia a mente, cria um ideal de família, sexualidade e atitude sem debater”, avaliou.
Mudanças na legislação
No segundo dia do evento, Emanuely Gestal da Silva, agente de proteção no Centro de Referência de Atendimento ao Imigrante em Santa Catariana (Crai), explicou a nova Lei da Imigração brasileira. Por um lado, essa legislação, segundo ela, tira o peso do imigrante como um inimigo e melhora os processos de regularização de novos imigrantes. Por outro lado, apesar de a mudança ser boa, ainda há algumas contradições. “Antes um imigrante irregular pagava 800 reais de multa, hoje pode pagar até 10 mil”, exemplificou a agente. Emanuely ainda comentou sobre a dificuldade de regularizar a situação de venezuelanos e haitianos, já que esses países não têm relação com o Mercosul.
No período da tarde houve um jogo que colocava os participantes da palestra na pele de imigrantes, demonstrando seus problemas diários, como violência, falta de dinheiro e o abuso sexual contra mulheres.