Sportswashing: quando o futebol respalda ditaduras
Copa do Mundo no Catar sofre tentativas de boicotes, mas não é a primeira vez que torneio mundial de futebol “lava a imagem” do totalitarismo
No mundo inteiro, um termo ganha força em discussões a respeito das incoerências da Copa do Mundo no Catar e da corrupção da Federação Internacional de Futebol (FIFA). Trata-se do Sportswashing – que, literalmente, diz respeito à “lavagem por meio do esporte”. No entanto, a prática a que este conceito se refere não é novidade. Historicamente, torneios globais de futebol respaldam várias ditaduras pelo mundo.
“Sportswashing é um termo que tem sido usado com mais intensidade nos últimos três anos”, explica Jürgen Mittag, cientista político alemão, historiador e professor na Deutschen Sporthochschule Köln. “Significa que o esporte em geral, o futebol em particular, é usado para melhorar a imagem, a reputação de um país, às vezes também de uma empresa.”
O estudioso esclarece que, com a ajuda do carisma positivo do esporte ou do futebol, cria-se uma imagem positiva para o país ou para a empresa e, ao mesmo tempo, esconde-se questões negativas, indesejáveis, injustiças de regimes autoritários. “Esse termo é muito falado, mas não é novo. Sportswashing é algo que sempre existiu”, comenta. Um exemplo que se pode encontrar no passado, segundo o alemão, é a edição de 1936 dos Jogos Olímpicos de Verão, sediados na Alemanha nazista. Na época, desejava-se transmitir para o restante a imagem de um país pujante, organizado e forte, tal como propagar a ideologia da raça ariana.
A Amnistia Internacional aponta que aproximadamente 15 mil trabalhadores morreram em obras para esta edição da Copa do Mundo devido às péssimas condições de trabalho oferecidas. Outro relatório divulgado pelo The Guardian registra cerca de 6,5 mil mortes relacionadas aos projetos de construções para o torneio.
Diante desse cenário, torcidas organizadas alemãs organizaram boicotes contra o torneio. “15.000 mortos por 5.760 minutos de futebol! Vocês deveriam se envergonhar!”, exclamava uma faixa das torcidas do Hertha Berlin e do Bayern München em partida válida pela Bundesliga. Também em Dortmund, no estádio Signal Iduna Park, os torcedores do Borussia utilizaram uma faixa que dizia “boicote ao Catar 2022”. No Twitter, usuários manifestam a mesma indignação.
Felipe Montecristo, dono de um canal no YouTube e natural de Hamburg, na Alemanha, é uma das pessoas que acompanha a Copa do Mundo, mas não concorda com a escolha da sede. “O torneio no Catar é mesmo um escândalo e, normalmente, penso também que não se deveria apoiá-lo”, comenta. “Alguns jogos, no entanto, eu irei acompanhar mesmo assim.”
A série documental Fifa Uncovered, publicada pela Netflix pouquíssimos dias antes do início da Copa do Mundo, relata detalhes sobre as investigações de corrupção dentro da entidade internacional de futebol, revelando crimes de lavagem de dinheiro, fraudes, subornos e diversas outras atividades ilícitas. Uma das entrevistadas pela produção do documentário, Phaedra Almajid, foi responsável pela comunicação da candidatura do Catar e apresenta graves acusações de suborno contra dirigentes africanos que votaram a favor da candidatura do seu país: Issa Hayatou, de Camarões; Jacques Anouma, da Costa do Marfim; e Amos Adamu, da Nigéria, receberam 2,3 milhões de dólares australianos por seus votos. O esquema revelado pela série também inclui nomes de brasileiros e do próprio ex-presidente da Fifa, Joseph Blatter, que presidiu a entidade por 17 anos.
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