Rede de apoio transforma dor em força
A mulher violentada precisa de uma rede de apoio para se sentir acolhida e em segurança para compartilhar seu caso e denunciar o agressor. Esse acolhimento precisa ocorrer de maneira adequada e humanizada. A assistência mais conhecida é a Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI), onde a vítima realiza a denúncia. Entretanto, o horário de atendimento pode limitar o acesso das vítimas. Segundo o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 60% das mulheres agredidas preferem recorrer à ajuda de familiares. A Igreja onde frequentam também foi apontada por, 45% das entrevistadas e a opção amigos foi citada por 42%. Somente 31% das mulheres disseram fazer denúncias em delegacias comuns e 22% recorrem às Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher.
A psicóloga Juliana Lima Medeiros, da DPCAMI de Joinville, destaca que existem muitas mulheres que deixam de denunciar por medo ou vergonha, mas não há dados oficiais sobre a “não denúncia”. Evitar a punição do agressor é outro motivo que leva as mulheres a se calarem. Juliana conta que existe um protocolo municipal específico para vítimas de violência sexual, assim a agressão também pode ser detectada quando a vítima recebe outros atendimentos de órgãos públicos, como escolas, serviços de saúde e assistência social.
Em Joinville, a Casa Abrigo Viva Rosa destina-se a mulheres e seus dependentes em situação de violência doméstica e familiar com risco de morte ou grave ameaça. No período de acolhimento, rotinas são estabelecidas como alimentação, limpeza e organização dos espaços. Também são realizadas atividades lúdicas, pedagógicas, grupos e oficinas planejadas de acordo com a aptidão dos acolhidos.
De acordo com a Prefeitura de Joinville, a expansão do número de vagas na Casa Abrigo, no momento, não é necessária, considerando a demanda. São 24 vagas com acolhimento provisório de 180 dias, dependendo das situações apresentadas. Outros tipos de assistência são oferecidas às mulheres e crianças com parcerias para atendimento psicológico, jurídico e defensoria pública.
Cynthia da Luz, assessora jurídica do Centro de Direitos Humanos Maria da Graça Braz, defende a expansão do número de vagas na Casa Abrigo Viva Rosa. Para ela 24 lugares não atende as necessidades de uma cidade com mais de 600.000 habitantes. “É apenas uma forma de dizer que existe, mas não dá conta da real demanda,” lamenta Cynthia. Para a advogada, as estatísticas de violência contra mulheres em Joinville indicam a necessidade de um equipamento público muito mais robusto para oferecer um suporte adequado. “A Casa Viva Rosa é fruto de uma luta muito grande da sociedade civil de Joinville no sentido de implementar essa política pública de apoio à mulher vítima de violência,” explica.
O nome da instituição é uma homenagem à Rosa, uma mulher marginalizada que vivia na beira do cais do mercado público, simbolizando a exclusão e opressão sofrida por muitas mulheres.
A precariedade das estruturas e a falta de servidores públicos são pontos críticos destacados por Cinthya. Anos atrás a prefeitura extinguiu o programa específico que cuidava da violência contra mulheres, diluindo essa política nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), em vez de manter um centro de referência específico para atendimento. A política atual do governo municipal de Joinville para erradicar ou minimizar a violência contra a mulher é considerada por Cynthia como extremamente ineficiente. “Pode-se dizer, de forma segura, que não atinge seus objetivos,” afirma.
As vítimas que vão para o abrigo normalmente passaram por muitas dificuldades até conseguir quebrar o ciclo de violência. Há casos de mulheres cujos parceiros têm histórico de uso de substâncias psicoativas e até situações envolvendo facções criminosas.
Conforme informações da prefeitura, para garantir a segurança e a proteção das mulheres depois que elas deixam a Casa Abrigo Viva Rosa, há uma solicitação de medida protetiva, antes mesmo do acolhimento temporário. As vítimas são orientadas a manter a medida protetiva. A Polícia Militar, por meio da Rede Catarina, faz o acompanhamento das medidas vigentes. Ao sair do acolhimento, todos os casos são encaminhados aos CREAS (Centro de Referência em Assistência Social).
Baque Mulher, o ritmo que empodera
É impossível ignorar a presença delas. Quando chegam, o som dos tambores e chocalhos enchem o ambiente de ritmo, cor e dança. O Maracatu do Baque Mulher denuncia o machismo estrutural e a violência.
O Movimento Nacional de Empoderamento Feminino Baque Mulher engloba música, dança e história e ajuda muitas pessoas a construírem um novo futuro. Em Joinville, o Baque existe há 9 anos, e teve seu início a partir de integrantes que já tocavam Maracatu.
Apesar de não ser um canal direto de atendimento a casos de violência, o movimento promove encontros que são divulgados através das redes sociais. Isso traz mais proximidade para que as vítimas se sintam à vontade para contar seu cenário de violência. Segundo Josenita, uma das integrantes do Baque, as mulheres contam atos machistas sofridos. Por estarem em um grupo do qual os homens não podem participar, elas se sentem mais confortáveis para falar. “Quando temos rodas de conversa, que normalmente são temáticas, as mulheres costumam compartilhar suas histórias com as pessoas que estão participando no dia”, conta Josenita. Ampliar a rede de apoio às mulheres vítimas de violência é também uma forma de combater o machismo estrutural e, consequentemente, deixar um lugar mais seguro para elas.