Como a falta de estrutura e professores afeta a qualidade do ensino em Joinville
Saídas antecipadas das aulas comprometem o futuro dos estudantes da rede estadual
Maria Eduarda Alecrim
Joinville, a maior cidade do estado de Santa Catarina, enfrenta desafios em sua rede de ensino estadual. A ausência crônica de professores está prejudicando a qualidade do ensino e contribuindo para um aumento na evasão escolar. Este problema, que persiste há anos, está afetando diretamente o futuro dos alunos.
A Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina revela que 8,7% dos alunos do Ensino Médio da rede estadual abandonaram a escola em 2021. Embora os dados precisos sobre o abandono escolar sejam escassos, a situação é clara, a qualidade do ensino está em declínio e o número de alunos insatisfeitos e desmotivados cresce a cada dia.
Nos corredores das escolas estaduais de Joinville, a realidade é dura. A ausência de professores resulta em aulas reduzidas ou até mesmo canceladas. Maria Clara Dobrotinic (16), estudante do segundo ano do Ensino Médio, expressa sua frustração com o cenário atual, “uma aula vaga é uma perda de tempo e de aprofundamento nos conteúdos. É um pesadelo chegar na escola e descobrir que a aula foi cancelada”, disse.
A aluna compartilha uma experiência que exemplifica o problema, “teve uma vez que meus pais ficaram bravos, pois tive apenas duas aulas no dia. Além de ter saído do meu conforto, chego lá e não tem aula”. Essa frustração constante tem levado Maria Clara a considerar mudar de escola. “Minha maior preocupação é ter que saber de algo, mas não tive um aprendizado sobre o conteúdo porque meu professor faltou e atrasou toda a matéria preparada”. O impacto na vida acadêmica dos alunos é palpável.
Letícia da Silveira (16), também estudante da rede estadual, atualmente do terceiro ano, reforça a falha na cobertura curricular: “A falta de conteúdos importantes prejudica minha preparação para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Fico preocupada com a possibilidade de não estar completamente preparada para os desafios futuros”.
A voz dos pais
Simone Luz (53), mãe de um aluno da rede estadual de Joinville, expressa uma visão crítica sobre o atual estado do ensino. Para ela, o problema vai além da falta de professores: “Educar é transmitir saber, dar ensino, instruir, mas grande parte dos professores demonstra falta de controle ao tentar transmitir algo aos alunos”, afirma. Simone acredita que há um desgaste no sistema de ensino, onde grande parte dos educadores, muitas vezes, parecem desatentos aos reais interesses dos estudantes. Ela ressalta a necessidade de uma reciclagem urgente no corpo docente, com foco no desenvolvimento da didática e na comunicação com os alunos. “É extremamente necessário que o professor instrua, mas para tal ele deve ser acolhedor e bom comunicador. Só o conhecimento, nos dias atuais, não é o suficiente”. Ela acredita que o sucesso na educação depende de um ensino que valorize a voz ativa dos estudantes e a capacidade do professor de repassar o conhecimento de forma eficiente. “A principal fonte de sucesso está saindo da sala de aula por não saber repassar conhecimento. Saber para si, não é o suficiente”, conclui.
Desafios enfrentados pelos professores
Eliane Grossl (43), que leciona Educação Física, já assumiu várias turmas que estavam sem professor. Ela revela que a falta de professores sobrecarrega os educadores existentes e compromete a qualidade das aulas. “Lidar com turmas grandes e a ausência de colegas torna a tarefa quase insuportável. A sobrecarga reduz a qualidade do ensino e afeta a saúde emocional dos professores”. Os problemas enfrentados pelos professores são evidentes: salários injustos sem reajuste a anos, déficit de formação continuada de qualidade, condições de trabalho precárias e falta de reconhecimento são apenas algumas das questões. Eliane salienta que “a valorização dos professores em Joinville é insuficiente. Precisamos urgentemente de reformas que garantam melhores condições de trabalho e salários justos. Nos falta autonomia e participação nas decisões que afetam o ambiente escolar”.
A crítica é mais do que a falta de professores e de estrutura. Carla Delfino, coordenadora regional do SINTE-SC (Sindicato dos Trabalhadores em Educação de SC), denuncia um possível projeto de desmonte da educação pública. Em entrevista à CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), Delfino afirma: “O sucateamento das escolas públicas é uma estratégia para favorecer as escolas privadas. Quanto mais precária for a escola pública, mais atrativa se torna a educação privada para aqueles que podem pagar por ela”.
Os desafios enfrentados pelas escolas estaduais em Joinville retratam um sistema que falha em priorizar a educação pública e garantir condições adequadas para alunos e professores. A situação exige ação imediata para evitar que o futuro dos jovens da cidade continue a ser comprometido pela negligência e pela falta de investimento.
Tentativas de contato com a Coordenadoria Regional de Educação de Joinville, para obter uma declaração oficial sobre a situação, não tiveram sucesso até o fechamento desta reportagem.